O vento, o Portão e a Deusa Azul. ( 003 )
- kamposu43
- 21 de jul.
- 4 min de leitura
Atualizado: há 7 dias
Ao abrir a porta, uma ventania fresca passou por ele, fazendo-o dar um leve sorriso. Luck caminhou para fora, deixando a porta semiaberta. Moveu-se rapidamente pelo belo quintal esverdeado, com a grama aparada e protegido por um muro que contornava toda a área e a casa. Por fim, chegou ao varal, retirou seu par de tênis e voltou para a sala, fechando a porta atrás de si.
Já dentro de casa e sentado no sofá, Luck viu seu pai entrar no cômodo com um talco e meias nas mãos. O homem entregou-os rapidamente ao filho e ficou encarando-o, com um olhar semicerrado e fixo.
— Só não esquece a cabeça porque está grudada — criticou o velho, com voz grossa e lenta, cruzando os braços em seguida.
— Pai, pode pegar para mim a chave do carro? Ela está do lado da televisão!!
— Você vai de carro? Acho melhor ir de bicicleta. As ruas devem estar lotadas agora.
— Nem! Vou de carro mesmo. Já que de lá eu vou direto fazer as corridas e tal, sabe?
— Humph! Acho melhor você voltar direto para casa, sabe, Luck? Ontem você trabalhou até tarde. Não acho que esteja 100% para trabalhar hoje. Vai descansar, moleque! — repreendeu o Velho, virando-se para pegar o que Luck havia pedido.
— Que nada, pô! Mas fica tranquilo. Dessa vez não vou ficar até tarde, prometo!
O velho pegou a chave do carro e a entregou ao filho, que já estava de pé. Luck guardou-a no bolso da calça e, com um sorriso no rosto, cumprimentou o pai com um aperto de mão antes de dizer:
— Sua bênção, meu velho pai. Já estou indo!
— Deus te abençoe, meu filho.
Luck virou-se, deu as costas ao pai e caminhou em direção à porta. Antes de sair, já com a porta aberta, olhou para o velho e disse:
— Tem como o senhor abrir o portão para mim, na moral?
Seu pai revirou os olhos.
— Tá, vai logo lá, senão você vai se atrasar ainda mais!
— Pode deixar... — respondeu Luck, já caminhando pelo gramado.
Enquanto isso, seu pai saiu da casa e foi direto ao portão laranja que ficava na divisa entre a calçada pública e o quintal.
Ao chegar ao fundo do quintal, Luck avistou a garagem improvisada que havia construído. Era bem simples: um teto de telhas galvanizadas sustentado por quatro pilares de cimento — nada além disso.
O jovem entrou em seu carro preto, de formato angular que lembrava um cubo sobre rodas. O veículo era baixo e compacto por fora, mas quando Luck finalmente se acomodou no interior, tornava-se evidente que o espaço era surpreendentemente amplo — além do couro preto que revestia tudo, do teto ao piso.
Luck ajeitou os retrovisores, colocou o cinto de segurança e ligou o carro. Respirou profundamente antes de começar a se movimentar em direção ao portão, que já estava completamente aberto, com seu pai ao lado, em pé e observando.
O carro desacelerou e parou em frente ao pai de Luck. Com um click, o vidro do motorista deslizou para baixo. O jovem apoiou o braço na moldura da janela enquanto olhava para o velho.
— Vou indo, pai. Fique com Deus — disse Luck, com voz grossa, mas pausada.
— Anda logo e some daqui! Mas vá com Deus e cuidado com a estrada.
O sorriso de Luck ainda estava estampado nos lábios quando engatou a marcha. Por fim, o carro arrancou do quintal. Por um instante, enquanto se afastava, Luck olhou para o retrovisor interno — aquele pequeno retângulo de vidro — e encontrou os olhos do pai, que já estava à beira da rua, com a mão erguida em um tchau silencioso. Involuntariamente, mais um sorriso escapou do canto da boca do jovem.
Quando virou a primeira curva, quase sem querer, olhou rapidamente para trás e viu o pai mais uma vez. Deu duas buzinadas, um sinal de despedida perfeitamente compreensível para o velho.
O carro de Luck corria pela estrada em velocidade moderada quando, de repente, seus olhos castanhos se distraíram por um instante, fixando-se na calçada oposta, à direita.
Pisou bruscamente no freio, fazendo o veículo deslizar por alguns metros antes de parar.
A pessoa que chamara sua atenção tinha uma beleza andrógina: corpo magro, mas com músculos definidos sob uma camiseta cropped azul de seda, que exibia a barriga trincada, os ombros e as costas alvos. Vestia ainda uma calça jeans boca de sino preta, justa o suficiente para marcar suas curvas.
Os cabelos lisos — que caiam para fora da touca em sua cabeça — iam até a nuca, tinham tom de azul idêntico ao do batom nos lábios e do esmalte nas unhas. Uma franja cobria metade da testa, enquanto uma pequena pinta no queixo acentuava o rosto delicado.
Luck suspirou profundamente, como se quisesse encher os pulmões de ar antes de gritar. Apoiou o braço novamente na moldura da janela aberta, inclinou a cabeça para fora do carro e, com um sorriso largo que ia de orelha a orelha, exclamou:
— Ei, minha Deusa! Pra onde você vai, Alex? — gritou Luck, com um tom cheio de alegria. Sua voz soou grossa, seu olhar ganhou vida enquanto aquele sorriso enorme dominava seu rosto.
Alex olhou rapidamente na direção de Luck — o grito e o barulho dos pneus deslizando no asfalto haviam lhe dado um pequeno susto. Por alguns segundos observou Luck, com um olhar curioso, até então soltar um leve sorriso de sua boca.
Com uma de suas mãos, e ainda parada, mostrou um joinha para Luck, para logo depois dar alguns passos para frente, ficando em cima do meio fio. Alex então colocou sua outra mão na cintura de forma bem calma.
— Oi Luck, nem te vi!! O que está fazendo? — disse Alex, falando de forma alta, com um timbre grosso misturado com uma suavidade meiga, quase angelical, nas entonações mais leves.
Luck, por sua vez, antes de respondê-la, colocou de volta sua cabeça para dentro do carro.
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